quinta-feira

Brinquedos Afiados...

Existe algo notório sob a Cartola preta – Parte Final


No centro do picadeiro, banhado pela escuridão, Pierre soltava gargalhadas que ecoavam pela arquibancada.

A massa de corpos corria por direções opostas. Os gritos aos poucos se tornavam o barulho constante do final do espetáculo. Baques secos de quedas da arquibancada, gemidos de nojo ao encontrarem os cadáveres pendurados... E logo, vieram as risadas.

Não eram totalmente felizes, como as de Pierre; Eram altas, histéricas, loucas. Ecoavam, entrando nas orelhas suadas e se misturando com medo dentro das cabeças de uma maneira que gargalhadas nunca antes conseguiram fazer.

Vinham de várias direções. Começaram atrás de Pierre, atravessaram o picadeiro, subiram pela arquibancada e se misturaram na massa de corpos.

Agora dois barulhos reinavam. Gritos de medo e desespero e gargalhadas sanguinolentas.

Logo, mais um surgiu.

Mordidas.

Barulhos pastosos. Bocas mastigando.

Gritos de dor. Dor insuportável.

E mais gargalhadas, descontroladas, frenéticas.

Aumentavam o volume. Os gritos ficavam mais intensos.

Barulho de pasta espirrando, pintando a madeira como tinta.

Mais barulho de mordidas, menos gritos ecoando.

"Creio que é hora de finalizarmos" Comentou Pierre; então estendeu os braços e gritou "Não temos como falar o quão agradecidos estamos pela presença de todos! Esperamos que tenham se divertido assistindo nosso humilde espetáculo! Mas é uma pena que tenham que ir..." – Um baque seco ecoou abaixo da arquibancada – "... Por que não ficam mais um pouco?!"

Um barulho escorregadio ecoou. Subiu, se misturando às gargalhadas e aos gritos.

Sons enferrujados ecoavam to teto. Logo, os barulhos de facas voltaram.

Mais gritos de dor.

As gargalhadas cessaram, e apenas os sons escorregadios carregavam os gritos agora.

Pierre e todos os artistas assistiam. "É hora de iluminarmos tudo de novo!" comentou ele.

As luzes reacenderam.

Os barulhos escorregadios revelaram-se: imensos tentáculos de pura escuridão saíam de baixo da arquibancada, carregando, enrolados em suas pontas, os poucos sobreviventes que gritavam.

Deram rodopios no ar, então voltaram para baixo da arquibancada, levando consigo os últimos gemidos de horror.


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O cenário tinha marcas de mutilação por todo lugar. A madeira estava pintada de sangue; por todos os cantos, era possível encontrar restos de pele, carne e alguns dedos ou orelhas. O cheiro de carne fresca impregnava o ar.

Pierre caminhava pelo picadeiro com Mortina.

"Como estão todos?" perguntou ele.

"Precisa ver a cara deles, Pierre! Estão se divertindo com o banquete! Tenho certeza que foi um dos nossos melhores espetáculos até hoje!"

Pierre sorria. "Era a sensação que tive quando chegamos aqui... Nimsburgo é uma cidade digna para um espetáculo nosso!" Seus olhos se apertaram "No entanto, ainda sobraram alguns moradores em suas casas, certo?"

Mortina assentiu.

Pierre coçou o queixo pálido. Sua cara de dúvida aos poucos dava espaço para um sorriso. Seus olhos brilharam. "O que fizeram com as cabeças?"

"Guardamos" respondeu Mortina "Mosster disse que você encontraria um bom uso para elas... Como sempre..."

Pierre soltou uma gargalhada.

"Mergulhar cabeças em cera para parecerem falsas foi mesmo uma grande idéia... Mosster fez certo mais uma vez! Reúnam as cabeças!"

Mortina suspirou.

"Tem certeza? Temos expressões ótimas! Encontramos uma que pode até ser possível ouvir o grito do sujeito ainda..."

Pierre sorria, olhando para as máquinas sujas de sangue.

"Ora, bem... Não vou precisar de todas... Uma por família! Acha que Mosster consegue identificar os parentes das pessoas que ficaram em suas casas?"

"Vamos perguntar" respondeu Mortina, deixando um sorriso estender-se por seu rosto pálido.


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Na manhã seguinte, algumas campainhas tocaram.

Poucos moradores ficaram em suas casas: Filhos de castigo, Avôs e Avós que não queriam sair de noite, Mães que acabaram de ter seus bebês e Doentes de cama.

Cada um deles iria abrir a porta e encontraria uma caixinha listrada de preto e branco, enfeitada com um belo laço verde-escuro.

Dentro, encontrariam uma lembrança peculiar de seu ente querido.

E um bilhete.

No bilhete, estaria escrito:

"Esperamos você no nosso próximo espetáculo. – Submundliee, o espetáculo mais assustador do Planeta"

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